12 de jul. de 2012

Esquina poética


Dá licença,
deixa passar os trapos no lajeado de pólvora,
as carroças e os carros de lixo
Vou tricotar toda essa migalha no meu viaduto,
tirar o luto e desenterrar a fartura do céu

Aliás,
pedir licença é ser educado com o
enviesado preconceito...

-Sai da frente! 

11 de jul. de 2012

Cais


Há uma goteira decepando
meus rabiscos
Uma foice de borracha
apagando o grito do livro
E da janela o assobio do vento
me convida pra dançar poesias
No silêncio do cais

10 de jul. de 2012

Cena Francesa


Sua pele clara em pó de arroz
Ah, boca louca
Vi você passar pela ponte d’Alma
de vestido rubi

Tua roupa disfarçando as silhuetas
de uma flor
Perfumada beleza de cinema
E teu visual Jean Harlow

Você me arrastou
para a Rua do Sena
e paralisou meu viaduto
-Cena Francesa, tu és tudo!

Penetra no sangue da minha veia
o suor que borbulha
na taça do teu útero
de velas e fagulhas

Essa noite serei seu fã
Quero tua prisão feminina
e a cereja da manhã


Ai do mar


Terra verde chora,
eterna solidão sólida
Sinto a pedra partir
desde a dor do parir

Quando nasci nasceu
a rosa rara de ver
Ninguém espetei!
Eu cresci,

pés no chão, sete pedras
lâminas agressivas 
desastres, explosões
diamantes e vulcões

Ah, meu amigo
corremos perigo desde já
Ai da terra e do mar
Um tobogã cuspindo chumbo

É ferida, há feridos!
E não fugimos do mundo,
dos falsos amigos
Extinção de línguas

Saudosa tribo, caçadores e índios
Retina do meu oceano
aprendi a amar porque foi a dor,
foi a dor que me deu o amor!


3 de jul. de 2012

Sentimento embriagado



No passeio de ruas maquiadas
a fome despercebida
ronca em sombras de palácios
esfriando papelões

Burgueses
Franceses
pagando moças na avenida
e ainda é 1956

Descalços artistas,
pintores e equilibristas
lazeram água e pouca comida
Abastecem cascas na barriga

Sujeira no telhado
Lentes de aumento sentimental
faltando no mercado
Engraxates de sapatos

A dolência uiva as noites
de inverno
Damas de um lado desfilando rosas
e cavalheiros de terno

Incalculáveis valas profundas
candeeiros
catacumbas
mulheres imundas!

Vinga ali na lama os
ossos daquele velho
alimentando cães abandonados
Políticos disfarçados

Automóveis blindados
Imagine em 2034
este poema aqui será amassado
e os poetas serão presos embriagados de tristeza...


1 de jul. de 2012

Poeta de mim


Que dor
que dor ardida
Um eito de pedras
lançaram na minha janela!

Rasgou,
rasgou minha ferida
Fiquei doente
e fui beber água
salgada...

Curei-me silente,
do concreto de veludo
Virei poeta de mim
e carrego nos poemas
toda dor do mundo!


26 de jun. de 2012

Essência


Sou vacinada contra a estupidez...
Outros,
amantes da intolerância
tomaram a pílula da ignorância!
As pessoas estão
tão reprimidas
que a ternura incomoda
e amor já exala desconfiança
Essa é a injusta
essência
da  existência

Ei vida que só celebra a beleza,
aqui vai uma chamada de
transparência:
-Alô, sou eu, a velhice
a doença...


18 de jun. de 2012

Herdeira da flor


Eu sou filha do ventre
de lírios casados
descansados da minha voz

Sou do seio que palpita no campo,
saudosa flor que respira
Sou derramada do leite
alvacento que me inspira

Sou filha dos olhos
apagados de escamas defeituosas,
herdeira da cegueira
sinuosa

E desta flor, sou rabisco
perfeito
Escuto e vejo!

Sou filha da filha de índio
e esguardo gênios
engenhos de filhos
enternecidos

Sou da flor que me pariu,
lírios da estátua audição
São encantadores da arte
e proliferadores da minha perfeição










''Poema dedicado aos meus pais''

14 de jun. de 2012

Notas nuas


Tem uma voz que me grita
faz trilha, me tira do sonoro
sono derramado

É orquestra em
sete sóis que alguém
toca

Tem uma voz que grita,
arranca minha roupa,
deixa-me louca
A voz não é rouca!

Lá está a voz assassina
do meu pudor
Em cena o piano me acena,
não há ninguém no palco

Atiro meu corpo
como quem veio do pó
e entrego meu suor aos
ossos de madeira pintada

E satisfeita vou desfilar
meus cabelos e esfumaçar
meu cheiro, chérie
Dançar girassóis por ai



9 de jun. de 2012

Rosa secular



Meu papel guardado,
amante da poeira.
Vazio como minha
garganta seca.

É o seco secular
já morta de vida,
sem cor, sem tinta maculada.

Ela é filha da despetalada,
roubada no jardim
de Berlim.

Não é rosa malvada,
é lembrança guardada.
Antes bela, hoje apagada.

És herdeira perfumada,
carimbo do teu coração.
Guardei a pétala ferida de saudades
dolente e sofrida...





Apocalipse


Sim, eu vi sete caminhos
abandonados
de rios e lagos e um remo
a boiar sozinho

E os meus olhos vendo de perto
sombras de um deserto
Pássaros feridos, esperançosos
deleitando a céu aberto

De repente a penumbra
de longe repartia o clarão,
e das areias molhadas surgia
uma mulher que abraçava o moço d´água

Era a imperatriz comprometida
a virar lama sem saída
Dama marcada,
destruída!

Sim, eu vi quatro cavalos de guerra
a descer das nuvens
e um dos cavaleiros segurava um
rolo com sete selos

Os galopes relinchavam
trovoadas rasgando
a névoa da alvorada
e nenhum receio eu sentia

Eu vi do outro lado
da ponte Miguel
a derrubar Babilônia,
a grande!

Esguardei tudo de perto
em um casulo onde
não fugimos da linhagem velha
de uma pele a sete palmos da terra.

Sim, a profecia estava
a se cumprir
sobretarde, sorrateiro

Eu sorri
Não tive medo...
Sabia que estava pra chegar
uma era de paz e sossego!


3 de mai. de 2012

Himeneu


Quebre essa parede
e vem matar a sede
que bebo
com volúpia.

Tira esse véu
e deixa eu pôr o anel
que define o nosso amor
em núpcias.

Deixa os nós, os nus e os tais
serem reais. Concretamente,
deixa-me banhar nos sais
pelos quais te revolveu.

Quero ser teu,
quero ser teu,

na banheira,
nos quintais,
nos sonhos fatais.

Quero ser eu
suas digitais, pois depravado sou
e não vou morrer jamais
se me jurar uma noite de amor.

Vem, me abrace.
Quero ser eu
o que é teu, nem que seja
só plebeu... Me enlace!


2 de mai. de 2012

Traição


A transe não move fios da mente,
e vai congelando suas vistas,
desfilando suas pálpebras
em calda fervente.

Essa coisa que
lhe assassina subitamente
tão de repente, lhe apavora
nos segundos de tortura.

Ela, a dor
é como um parafuso
sendo desenroscado
do seu estômago, e se demora...

O ponteiro para,
o som se ampara,
o chão se abre rapidamente
e sua alma se escora.

A dor que dói não é dor que mente,
é atrocidade de certa gente transportando
poluição aos seus olhos perdidos sobre
o beijo traindo sua boca simultaneamente.


25 de abr. de 2012

Apetecida


Deixa meu corpo encostar
em teus ossos e sentir
tua febre desejando minha
moldura dos quadris em graus de fome!

Deixa chover sobre nossa
pele o gosto do céu,
e quem sabe o sol
apareça sorrindo no horizonte.

Quero que desobedeça
suas mãos libido
e deixe-a retratar a nossa
dor da sorte, que arde e morde...

Leva meu nome, meu botão,
minha sombra, meus beijos.
Tatua-me tua alma
sem medo.

Deixa-me apetecida,
só não deixe feridas
no meu peito, é que agora
você faz parte da minha vida.

E a rua fértil do meu corpo
são vias do gosto que
ferve de amores por você!


24 de abr. de 2012

Amada


Ela deitou-se com a roupa molhada
no chão do quarto.
Está dormindo, tendo pesadelos
infindos...

Um corpo, uma alma, uma amada.
Acorda a rosa que está despetalada
na sua estrada do quadro derramado...
Essa ai, estirada.

Não deixe a tinta dos olhos
dela molhar outro ombro,
nem os cacos dela
ferir seus pés no tapete encharcado.

Deu pena, a maquiagem borrada,
o cabelo embaraçado e o coração
debilitado.
Quebre o orgulho e acorde a bela...

Desfaça a figura triste
que lhe machuca só
porque a figura manchou a sua tela.
Quem sabe ela não tem pincel, mas é sua pintura.

Acorde-a,
repinte-os...
Quem ama, cuida!




23 de abr. de 2012

Apenas você


Sirva-me um chá
e deixa eu lhe contar com os pés
descalços, encolhida em seus braços,
os embaraços que a vida me deu...

Quanto nada invadia
meu dia, me acompanhava,
dava-me a mão
e me seguia.

Eu era esse nada que guiava
e  o nada me escolhia.
Dançava valsa com os beijos
cegos de desejo e desfalecia.

Engenho meu e a solidão eu escupia.
Os amores cumprimentavam
meus vestidos e as flores a eles
caiam onde eu passava.

Quem sabe eu era um nada
porque nada de mim eu dava...
Rabiscava os nomes
e nem saudades sentia.

Sirva-me um chá
e deixe eu lhe contar
toda dor que não doía
porque ninguém eu gostava.

E dance comigo
enquanto o chá esfria.
Meu tudo, me guia...




12 de abr. de 2012

Inverno sem você



A luz é tíbia
nos escombros do meu peito...
As cinzas que respiro
são dez cigarros de consolação.

Queria respirar os álamos
da praça e ver duas sombras
esquecidas. Aviventar os beijos
da alma viva.

Mas meu relógio partiu
junto ao trem das oito,
e de recordação você
só deixou um chapéu na estação.

Hoje deitada
em crepúsculo, vi a névoa
pela janela... Estava sem asas
no leito perdido a sua espera.

Devolva-me o dia,
meu rei...
As minhas asas não funcionam mais.
Devolva-me a paz.

5 de abr. de 2012

Pérola da alma


Cansei desta gente
rodeando meu coração.
Eu não sou só beleza,
tenho riqueza no peito 
e lá mil defeitos na emoção!

Não sou de qualquer
palavra e nem
estou acostumada
a me entregar por qualquer
canção.

Sou diamante de papel frágil à pureza.
Sou essa qualquer coisa
de uma caixinha de surpresas.
E não tenho pressa para abrigar
um coração... Falo isso pela razão!

E não espere que eu adore
quando me chamar de
''meu amor'' todos me chamam assim!!
Quero o que é natural
e não filas de atenção ao meu corpo.
Viu por acaso se meu carinho é torto ou
se vou pôr flores no café com pão?

Não sou uma pérola que
alguém escolhe usar
- todos gostariam de ganhar!
Sou a pedra que prefiro escolher
a quem quero enfeitar.

Porque sou uma só,
e só um pode me enfeitiçar.

31 de mar. de 2012

Soturno


Alma de porcelana
que não faz nenhum escárnio
do amor lapidado,
não se atira à lama!


Quando ignorada,
sai fogo pela torneira
em pleno outono onde
as folhas secas retratam solidão...


Ressalto, meu amigo,
que coração ferido
é amigo da dor, e a dor
é pedra rasgada!


Pele alvacenta
sem sentir gosto de sol
por conta da garrafa de tequila
que estende-se vazia no chão da sala.


Prostrado,
paralisado,
perdido.
O coração bate sem fazer sentido.


E o que convém é
cavar o ermo sem riscar
nomes no vazio...



Menininho


No barro do beco,
dois pés descalços
de um menino sujeito
a sorrir sem jeito e sem nada...

Aquela criança corre
da casa rachada,
da fonte sem água,
do piso quebrado pra quebrar galhos por ai...

Aquela criança de nome e sobrenome,
vem do ventre cansado.
Poeira,
sujeira,
olhar calejado,
estômago desesperado!

E no beco do barro molhado
o sol despede-se
depois de tomar caldo de cana
e adoçar o rosto do menininho sem sapatos...





27 de mar. de 2012

Ferrugem



O porto é o remanso do corpo,
e as ondas é o que me possui.
A cor que me pinta vai ressaltando
a tinta que corre na minha garganta.


Embebedo meus olhos
lânguidos e espertos de tanto
desejo que o meu útero
desperta, e que em mim sobejo...


Beijo a garrafa com os
lábios suados de vinho,
e deixo escorrer uma gota
pelas mãos até pingar minha ferrugem!


Fico tresloucada pela
gota gelada que afeta meu espinho,
e sinto cheiro de pétalas de flor
tatuando ninho...


Minha ferrugem não tem dor,
tem só ardor de estar sozinho.
Me lazera devagar, e me
queima sem ninguém por perto!


Essa coisa de estar só, não é o que anseio.
É que sou essa solidão
como a tinta que percorre os meus seios
nas noites em que devoro poesias!


25 de fev. de 2012

Tarde em Paris



Minhas mãos na seda
sede a dança em mesa.
Pego o borgonhês e
seco o vinho que acompanha a massa.


Duas taças, três taças,
e meu decote de freguesa
pra dois moços em outra mesa.
Vez outra uma garfada.


Meu ufanismo perigoso
encorpora meu pouso dos
dedos sobre os  óculos.
E vejo turvo... será o álcool?


Cruzo as pernas, peço um café,
retiram os pratos, e me
desenho fina, num elegante
restaurante da esquina.


Cafeína, é nada!
Joguei o euro,
vesti meu casaco francês,
e ignorei a dor nos pés.


Na saída, procurei meu cigarro,
adiantei com um pigarro,
dei dois tragos e retirei meus
sapatos para dançar na neve.


Insânia, morfina, heroína?
Que nada!
é coisa fina, pois sou menina...
E só me deram um mês de vida.



18 de fev. de 2012

Cerrei olhos, serrei a endoderme.



Devo meus passos no ato
do alto pra pousar meu
pouso e repousar sorrindo
ao ver de longe você sumindo...


    Tua presença pesava meu corpo,
    corroía meu osso,
    chorava meu pulso.
    E o impulso era nada!


    Eu amava um ser vestido
    de carne, esculpido de dor.
    Se era amor,
    que amor arde?


     Suei meu sangue nas veias
     numa noite de inverno
     com um simples hidróxido de
     ferro, e serrei minha endoderme.


     Quem disse que doi como o amor?
     Doeu a dor de rasgar a epiderme,
     e eu não sentia dor maior
      que já me tinha.


De quem corre a minha alegria?
Da melancolia, desalento,
misantropia ou esmorecimento?


Fique atento... É tudo destreza
pra golpear a lua, pra lhe tomar
tempo enquanto aqui estou
nua, e chorando sangue  pelos ventos...



A lama na lama



Um copo um prato um garfo...
Na porta da sala apenas um sapato velho,
um lençol, um cobertor e uma almofada.
E na beira da estrada um caminhoneiro.

No espelho uma rachadura.
No porta-retrato com alguém ao lado,
uma teia.

E aquele gato com Correntinha no pescoço,
comendo aquele almoço de dois dias.

Ao lado da mesa um barril.
No calendário da parede,
há dois meses naquele mês de Abril.
Lá fora um frio...

E aquele moço sem sentimento
chegando sempre às três.
Ele entra de surpresa,
fala com sua Duquesa
que toma banho sempre em cima da mesa.

Vai aprontar comida,
enche sua barriga,
e cochila na sua única poltrona sem poeira.

Um copo, um prato, um garfo...
No meio da ladeira vem vindo sem controle,
um homem sem cegueira.

Um ronco na salinha,
um relógio sem bateria,
um estrondo a luz do dia.
E aquele moço,
sem dinheiro e sem pescoço,
foi parar na cozinha.

Um copo, um prato, um garfo...
Continuará ali,
junto aos estilhaços que antes não tinha.



30 de jan. de 2012

Utopismo



O pastor levemente cansado
deita na grama onde
a felicidade reina.


E uma moça de chapéu,
desfila seu corpo cheio de flores
que a sombra  do jardim enfeita.


Na fonte, a imagem
da ponte onde há ninfas
quebrantando os corações com a lira.


E aquela pouca gente de túnicas
vermelhas a confundir com rosas
a despetalar...


Sonhei meu vago desejo
de 1850 em Arcádia,
e logo me lembrei da pintura de
Friedrich von Kaulbach.



28 de jan. de 2012

O café Terrace de Van Gogh


Já nem é 1888 e eu aqui,
pintando minha imagem
com um simples café
e um vestido de paete dourado.


Os sapatos arranhados sobre
a cadeira ao meu lado,
ocupa o lugar de um amado.


A solidão perpetua ali...
E minh'alma no amargo de um café
na esquina de uma praça. 


17 de jan. de 2012

La beauté de La Joconde



Tapete vermelho, fotografias, 
um tropel de falas e, 
a madeira de álamo expondo a pintura...


Olhos nus, hermética.
Não há concreto na tua história,
só o abstrato na memória...


Aviventam a incógnita do teu corpo-figura,
das cores extintas
do lugarejo em que se pendura.


O código ressaltado,
como quem pincela a minha face
no espelho... 


Entro em transe!


Vejo-me com um belo vestido
de Visconti-sforza 1489
E assemelho o senhor da portaria do
museu do Louvre, ''o barba branca''


Desfaleço do século XXI 
e descubro o segredo do teu
sorriso monalístico
imperceptível aos olhos que o mundo esguarda!





11 de jan. de 2012

Amanse, oh rosa fria...



A língua que escarnece,
moteja, maltrata,
tende a ter alma vaga.
E vaga!
Sê sábio, oh rosa perigosa,
e sangre a tua dor de não amar ninguém,
ao invés de sangrar o coração do bem!
Ai te arrancarão espinhos, e te darão beijinhos até sarar...